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por isso que a lei wisigothica, impregnada do espirito dos concilios de Toledo, sanccionava o novo systema penal. A nação portugueza, nascida nesta phase da evolução penal, não podia deixar de sentir a sua influencia.

O ultimo character assignado ao germanismo é expresso nos symbolos juridicos, que, ao parecer do auctor, se enxergam nos foraes portuguezes. Não podemos seguir o sr. Theophilo Braga em todas as suas investigações sobre a symbolica foraleira, porque o nosso fim não é combater todas as suas proposições. Não precisamos d'isso para edificar o nosso systema. Admittindo que existem alguns symbolos germanicos nos nossos foraes, (o que, todavia, não quer dizer que elles sejam exclusivamente dictados pelo espirito germanico) descoberta que é força confessar não pertence ao sr. Theophilo Braga, mas ao academico Alvares da Silva, a Viterbo e a outros, parece-nos, ainda assim, que é neste capitulo que o auctor se afasta, geralmente, mais dos preceitos da verdadeira critica.

No seu prurido germanista o sr. Theophilo Braga chega a enunciar erros historicos, que não escapariam ainda aos menos lidos na velha legislação portugueza. No mesmo livro sobre os Foraes, querendo demonstrar a origem germanica das nossas primeiras leis ácerca da instituição dos advogados, escreve:1

«Os factos provam á evidencia as origens germanicas do nosso direito: as mais pequenas circumstancias respondem-nos affirmativamente. Repugnava aos Codigos Barbaros a instituição dos advogados; de facto o heroe não sabe tergiversar com razões, corta pela verdade na sua

1 Pag. 75 in fin.

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inteireza rude. No primitivo direito portuguez transparece o mesmo espirito; Dom Affonso IV aboliu todos os advo gados:-Teemos por bem, que em nossa Corte nom aja Vogado, nem Procurador residente em nenhum preyto. Mais que dos preytos venhão as partes per si, ou seus Procuradores... Non possão filhar outros preytos ate que esses que trouxerem sejam desembargados.- Pedro I aboliu tambem os advogados em uma lei dada em Santarem.»

O sr. Theophilo Braga cita em abono da sua opinião a lei de 3 de novembro de 1390, cuja sentença extrahiu de Mello Freire. Aqui existe uma notavel inexactidão historica. O primitivo direito portuguez ácerca dos advogados não é a lei de 3 de novembro de 1390, dada por D. Affonso IV. Antes d'esta lei já tinham apparecido na jurisprudencia portugueza muitas outras leis, que, longe de condemnarem a instituição conforme o direito germanico, a admittiam e cercavam de garantias em harmonia com o direito romano e wisigothico. Ha uma providencia legislativa do reinado de D. Affonso III, promulgada em 1254 ou 1261, em que expressamente se favorecem os advogados. Esta providencia diz: «En outra parte he estabeleçudo como dous vogados boons seiam en a corte e per que outros menores sseiam e huma das partes aiam os dous que filhe qual ante quiser e o outro leixe a seu auerssayro. E aquesto fazemos nós em nos grandes preytos que o dereyto a nenhuma das partes desperesca e nos outros preytos de todo en todo.» Das palavras en outra parte he estabeleçudo se vê que esta lei não é a primeira em que se admitte a instituição dos advogados, e que, já antes d'ella,

1 Portugaliae Monumenta Historica, vol. I, fasc. 2., p. 240.

a mesma instituição era chancellada por outras leis. Nas côrtes de 1211, celebradas no reinado de D. Affonso II, lançaram-se os fundamentos da organisação judiciaria, promulgando-se muitas provisões relativas ás pessoas do juizo, e a alguma d'essas provisões parece alludir a citada lei de D. Affonso III. E tão ligada se considerava a instituição dos advogados á ordem do juizo e á administração da justiça, que a lei a sanccionava para que o dereyto a nenhuma das partes desperesca. É claramente dictada pelo espirito do direito romano.

Da mesma epocha ha outras providencias attinentes aos advogados, que provam sobejamente a origem romana d'esta magistratura judicial. A primeira é uma lei de D. Affonso III, que diz: «Estabelecemos que quando alguem tractar preyto na corte e á dous uogados na corte e nom mays que filhe ante qual quyser e o outro leixe a sseu auersayro como quer que sabha sa confisson e o presso del se lho deu rreçebao e fazemos por rremouer a malicia dalguuns.»

A segunda é outra lei do mesmo monarcha, que indica as pessoas que não podem ser defendidas por advogados, e que dispõe:2 «Outrosi moordomo nem sayam nom pode auer vogado per razom das coymas nem das outras cousas que demandarem per razom de seus officios.»

A terceira regula o caso do procurador que pede advogado e não comparece em juizo, faltando ao juramento, e diz: «Estabelecemos que se alguem iura de malicia quando pede uogado e lhi pooem dia assynaado a que o

1' Portugaliae Monumenta Historica, vol. 1, fasc. 2.o, p. 250. 2 Log. cit., p. 281.

3 Log. cit., p. 284.

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dê e nom vay ou manda por el ao dya assynado mandamus que fique por ffe peiuro.»

A quarta, finalmente, refere as pessoas que não podem ser advogados, e, estabelecendo o principio geral de que todo homem pode seer uogado en qual preyto quer, e por qual pessoa quer,1 marca algumas excepções, entre as quaes figura o preceito, conservado pela legislação posterior, de que nenhum advogado pode defender os dois litigantes na mesma causa: «nem homem que tenha iá o ssolayro ou parte dele dalguum pera teenr seu preyto nom pode seer vogado pola outra parte saluo se este de que ele tem o ssolayro tem outro vogado: e a outra parte nom poder auer vogado que tenha seu preyto.» Todas estas leis evidenciam que o primitivo direito portuguez ácerca dos advogados é muito anterior á epocha de D. Affonso IV, podendo, segundo todas as probabilidades, remontar á epocha de D. Affonso II, cuja reforma judicial foi completada por D. Affonso II.

Alem de tudo isto, da lei de D. Affonso IV citada pelo sr. Theophilo Braga não se conclue que elle abolisse todos os advogados. A lei diz unicamente-teemos por bem que en nossa corte non aja Vogado nem Procurador residente em nenhum preyto. O que a lei faz é abolir os advogados que havia na corte e não todos os advogados do reino. O sr. Braga neste, como em muitos outros assumptos, manifesta uma tal ausencia de critica historica, que chegamos a duvidar das suas altas qualidades de escriptor e philosopho. Terminando a sua proposição sobre os advogados, diz que D. Pedro I aboliu tambem os advogados

1 Portugaliae Monumenta Historica, log. cit., p. 308.

em uma lei dada em Santarem. Se D. Affonso IV tivesse, como o sr. Braga pretende, abolido todos os advogados do reino, de que serviria uma lei de D. Pedro I abolindo uma instituição que já não existia ?

Não apparece, nem pode apparecer em legislação nenhuma, uma providencia que venha abolir uma instituição que não existe. O que o distincto escriptor deveria dizer era que D. Affonso IV extinguiu os advogados na côrte pelas leis de 18 de fevereiro de 1332 e de 3 de novembro de 1352, e que D. Pedro 1, pela lei de 7 de abril de 1362, publicada em Santarem, extinguiu os advogados em todo o reino. Escrever que D. Affonso IV aboliu todos os advogados e que D. Pedro I aboliu tambem todos os advogados, alem de ser uma falsidade historica, que o texto do documento invocado não auctorisa, é um lastimavel contrasenso. As razões da legislação que extingue os advogados não devem ir procurar-se ao direito germanico: estão nas circumstancias em que se achava a instituição abolida. Os advogados, na sua quasi totali. dade ignorantes dos preceitos legislativos, obstavam por meio de fraudes á justiça dos pleiteantes, e tornavam morosos e complicados os processos. Não foi o direito germanico, foram os proprios vicios da instituição que occasionaram as leis de D. Affonso IV e de D. Pedro 1. Depois, quando os effeitos da fundação da Universidade se manifestaram com a disseminação da instrucção juridica em todo o paiz, a instituição renasceu com o direito romano, que a inspirara no berço, e contribuiu poderosa

1 Citadas pelo sr. Dr. M. d'O. Chaves e Castro, Estudos sobre a Reforma do Processo Civil Ordinario, p. 46.

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